quarta-feira, 25 de abril de 2012

A TEOLOGIA DA RESTITUIÇÃO


José Barbosa Júnior - recebido por e-mail e adaptado

Havia um homem, na terra de Uz, chamado Jó. Homem fiel e temente a Deus, íntegro em todos os seus caminhos ― o próprio Deus deu testemunho disto... Um belo dia (belo pra quem conta a história!), Jó recebe uma notícia... Uma, não: várias... Ele perdera tudo, todos os seus bens e o pior, todos os seus filhos. Amargurado, triste, arrasado (imaginem um homem perder num só dia todos os seus bens, e um pai perder num só dia todos os seus filhos), pouco tempo depois foi acometido de uma enfermidade desconhecida e devastadora, que lhe transformou o corpo em uma chaga viva e única, em toda a extensão da pele. A própria esposa e amigos não lhe deram o apoio necessário naquele momento de dureza, mas viraram-lhe as costas e acusaram-no de estar naquela situação por causa de seus próprios pecados. Traduzindo em poucas palavras, é a expressão mais perfeita de "fundo do poço" que alguém já descreveu.

Impregnado pela dureza que a vida lhe impusera naquele momento e por tantas perdas, Jó levanta-se do chão, e ergue um clamor:

" ― Restitui... eu quero de volta o que é meu!!"

Você e eu sabemos que não foi isso o que aconteceu, mas é sobre isso que eu quero falar... sobre essa onda de "restituição" que mais uma vez é trazida pelos "levitas" que nunca levitaram, nem levitarão, mas causam sempre grande confusão em nosso meio já tão confuso.

Vivemos pela graça. Graça foi, é e sempre será favor imerecido. TUDO o que recebemos das mãos de Deus é graça. Não temos direito a nada. Quando a Bíblia fala de sermos co-herdeiros com Cristo não está falando de coisas deste mundo, mas da glória que em nós há de ser revelada no dia de Cristo Jesus. Jó parecia entender isso desde o Antigo Testamento, ou seja, no início de tudo (segundo alguns estudiosos Jó é o livro mais antigo da Bíblia) já havia a noção da graça, que hoje tenta ser anulada pelos apaixonados e extravagantes re-judaizantes.

A idéia de termos “direitos” diante de Deus é egoísta, hedonista e humanista. O pior de tudo isso é que os defensores das idéias restitucionais (que são os mesmos que reinvindicam, tomam posse, conquistam cidades profeticamente, determinam e exigem etc...) dizem que os anos que nos foram roubados pelo INIMIGO, as coisas que nos foram tiradas pelo INIMIGO, os estragos feitos pelo INIMIGO vão ser restituídos pelas mãos de Deus, e utilizam-se de textos bíblicos sem o menor fundamento.

Senão vejamos: o texto bíblico mais utilizado para defender a idéia de restituição é Joel 2.25: “Restituir-vos-ei os anos que foram consumidos pelo gafanhoto migrador, pelo destruidor e pelo cortador, o MEU grande exército que EU ENVIEI contra vós outros” (grifos meus). Nem é preciso ser um grande exegeta para compreender o texto, simples e direto: não foi o diabo que fez o estrago da vida de Israel. Foi Deus mesmo quem mandou os gafanhotos e só ELE é capaz de restituir o que ELE mesmo tirou. E mais... quando Ele restitui alguma coisa é porque Ele quer, e não por obrigação nenhuma, muito menos por exigência ou determinação humana. Às vezes é o próprio Deus quem nos tira tudo para aprendermos lições que nos servirão por toda a vida.

Um outro texto que reafirma esta ideia está em 2 Crônicas 7:12-15, texto muito conhecido e usado pelo povo de Deus "E o Senhor apareceu de noite a Salomão, e disse-lhe: Ouvi a tua oração, e escolhi para mim este lugar, para casa de sacrifício. Se EU CERRAR OS CEUS e não houver chuva; SE EU ORDENAR AOS GAFANHOTOS que consumam a terra; ou SE EU ENVIAR a peste entre o meu povo; E se o meu povo, que se chama pelo meu nome, se humilhar, e orar, e buscar a minha face e se converter dos seus maus caminhos, então eu ouvirei dos céus, e perdoarei os seus pecados, e sararei a sua terra. Agora, estarão abertos os meus olhos e atentos os meus ouvidos à oração deste lugar" (grifos meus). Dá pra ver? É Deus, e não o diabo, quem manda bênçãos e castigos sobre o povo de Deus. Portanto, tenhamos o maior cuidado ao estarmos atribuindo ao diabo uma obra de Deus.

O texto que relata a vida de Jó deixa claro que o Senhor está sob o total controle do bem e do mal que sobrevém ao justo. Em duas ocasiões o Senhor permitiu a ação de Satanás contra Jó, mas em ambas impôs limites intransponíveis: "E disse o Senhor a Satanás: Eis que tudo quanto tem está na tua mão; somente contra ele não estendas a tua mão" (Jó 1:12); "E disse o Senhor a Satanás: Eis que ele está na tua mão; poupa, porém, a sua vida" (Jó 2:6). Até o diabo está sob completo controle de Deus quando o assunto é tocar naqueles que são propriedade exclusiva dEle!

No Novo Testamento, novamente não encontramos a ideia da restituição. Pelo contrário, Jesus deixa claro que muitas vezes teremos que renunciar a bens materiais, famílias etc por amor ao Evangelho, e que estas coisas não nos serão restituídas nesta vida, antes as receberemos cem vezes mais na vida eterna (Mt 19:27-30). Quando alguém foi confrontado com a ideia de abandonar toda a riqueza e opulência por amor ao Reino, saiu cabisbaixo e triste porque se recusava a abrir mão de tanta coisa (Mt 19:16-22).

Resumindo, nenhum texto do NT referenda qualquer restituição de coisas perdidas. Parece-nos que se trata de uma doutrina que só tem uma base em que se apoia: o hino!

Fora isso, a idéia de restituição como direito (eu quero de volta o que é MEU) anula a graça. O que é a graça, senão recebermos de Deus tudo aquilo que não merecemos, que não nos pertence e que nos é dado gratuitamente por aquele que é Senhor de tudo e de todos? Quando eu acho que sou dono das minhas coisas e que tenho "direito" sobre elas, automaticamente excluo o verdadeiro dono. Ninguém pode servir a dois senhores. Ou Deus é o dono de minha vida e por conseqüência dono de tudo o que me é dado, ou EU sou o dono de tudo e aí sim, sirvo a mim mesmo, tendo direitos exclusivos sobre aquilo que é “meu”, direitos inclusive de reivindicá-los de volta quando me forem subtraídos.

Mas e os estragos feitos em nossa vida realmente pelo inimigo, mormente aqueles efetuados antes de nos achegarmos à Sua graça? Deus não restitui? Sinceramente, creio que não!! Deus faz tudo novo!! Ele não está disposto a remendar vidas, ele as faz novamente. Não recebemos uma “lanternagem espiritual”, mas recebemos nova natureza. O que o diabo fez no passado... fica no passado... “eis que faço NOVAS todas as coisas”, pois quem está em Cristo, “NOVA criatura é, as coisas VELHAS, já PASSARAM, eis que tudo se faz NOVO”. Lembro-me do vaso nas mãos do oleiro. Ele não remendou o vaso, não colou com super-bonder ou durepox. Ele quebrou e tornou a fazer de novo (Jr 18)...

Não há restituição, há nova vida, tudo NOVO. Não há remendos feitos por Deus, há cura integral e perdão total. Há novo nascimento, novidade de vida. Quando entendemos isso, entendemos até as perdas que teremos que enfrentar, sabedores de que Deus é soberano sobre nossas vidas e é Ele quem nos dá o que quiser, a hora que quiser, para cumprir o Seu propósito. Quando percebermos essa verdade, e só então, poderemos dizer como Jó: “O SENHOR deu e o SENHOR tomou; bendito seja o nome do SENHOR!”.

"Porquanto, ainda que a figueira não floresça, nem haja fruto na vide; o produto da oliveira minta, e os campos não produzam mantimento; as ovelhas da malhada sejam arrebatadas, e nos currais não haja vacas. Todavia, eu me alegrarei no Senhor: exultarei no Deus da minha salvação. JEOVÁ, o Senhor, é a minha força, e fará os meus pés como os das cervas, e me fará andar sobre as minhas alturas" (Hc 3:17-19)

sexta-feira, 20 de abril de 2012

MARCO FELICIANO PRESIDENTE — OU QUEM MAIS ?


Aos poucos surge na Internet uma nova campanha encabeçada por evangélicos — pastor Marco Feliciano para Presidente! Como era de se esperar, duas principais vertentes se apresentam neste instante: os favoráveis à candidatura, e os contrários, todos eles apresentando suas razões... Chamou-me a atenção um dos principais argumentos pró-candidatura: se um torneiro mecânico chegou à presidência do nosso país, porque não um pastor evangélico?

A princípio, concordo inteiramente com a argumentação. De acordo com a nossa Constituição, qualquer brasileiro que não possua restrições políticas pode ser Presidente da República, seja ele sacerdote, torneiro mecânico ou catador de materiais recicláveis. É direito legal de todo cidadão. Portanto, nada existe contra a candidatura de um evangélico para o cargo máximo do Executivo de nosso país, e muito menos contra a candidatura do pr. Marco Feliciano, ou de qualquer outro pastor que lance seu nome.

Recentemente, correu em todas as redes sociais a notícia de que na Alemanha um pastor luterano havia sido escolhido para ocupar tal posto naquele país europeu, o que foi amplamente louvado pelos crentes brasileiros. Bem, qual a diferença entre um crente na Alemanha ocupar o cargo presidencial, e o mesmo ocorrer nas terras brasileiras? Por que tamanho levante contra uma candidatura “evangélica”? E qual é o grande agravante que existe no nome de Marco Feliciano, senão as diferenças teológicas? Por acaso “diferenças teológicas” são critérios políticos para escolha ou descarte de um nome para uma pré-candidatura?

As únicas restrições devem ser políticas. Estaria o Marco Feliciano capacitado para ocupar tal cargo? Ou qual “evangélico” tupiniquim estaria igualmente capacitado? Afinal de contas, o cargo presidencial em nosso país é sério, e exige preparo político de seu ocupante. Não é um mero cargo que primeiramente e mormente enobrece seu possuidor, como os cargos “apostólicos” e “episcopais” tão comuns em nosso meio, que têm por maior objetivo conceder poder religioso ao seu possuidor... 

Lamentavelmente, embora completamente plausível e possível, tal pré-candidatura soa-nos a princípio como mais um caso de “salvadorismo da pátria”. Os “atos proféticos” (muito melhor qualificados se chamados de “patéticos”) que declaram que “o Brasil é do Senhor Jesus” e que “feliz é a nação cujo Deus é o Senhor” tentam associar a vertente política (os que governam nossa pátria) a grupos “evangélicos”, como se dentre nós viesse o candidato perfeito, o melhor líder executivo, que resolveria todos os problemas da nossa cidade, estado ou país, porque Deus está com ele. Há muito tempo corre em nosso meio que “irmão vota em irmão”, em uma interpretação distorcida e equivocada de Dt 14:14-15 e de Sl 33:12.

Entretanto, uma rápida olhada no cenário político-religioso de nossa nação mostra que ainda estamos MUITO LONGE da plena capacidade de governar um estado laico, como se denomina o Brasil. Na verdade, os “evangélicos” brasileiros gostariam muito mais de impor suas posições a toda a nação do que buscar um consenso político. Se como cristãos evangélicos temos posições bíblicas sobre temas polêmicos (como aborto, homossexualidade etc), queremos instituí-las e impô-las como verdades absolutas, e não estamos nem um pouco dispostos a abrir tais temas ao diálogo e à discussão pública, numa postura claramente política e democrática. Somos teocráticos, e queremos impor tal posição à democracia, independentemente das posições religiosas ou arreligiosas dos demais cidadãos. Entretanto, qualquer cargo político desempenhado em um estado democrático e laico foge destas características religiosas radicais e xiitas. Podemos defender nossas posturas religiosas, mas devemos estar abertos ao diálogo democrático... 

E quando encontramos algum político "evangélico" que procura pautar sua conduta política sob estas premissas laicas, a Igreja é a primeira a se levantar contra ele, que está legislando ou abrindo debates de coisas que a Bíblia condena... Na última campanha presidencial, a assembleiana Marina Silva foi duramente criticada por se posicionar a favor de plebiscito sobre o aborto... 

Observem: não estamos descartando as posturas bíblicas acerca de tais assuntos, e sim mostrando que um Presidente da República não busca tratar toda a nação como se toda a sua população professasse a fé cristã “evangélica”. O Presidente não governa um estado “evangélico”, e nem busca transformá-lo em algo assim. Ele governa evangélicos, católicos, ateus, espíritas, candomblecistas e demais vertentes religiosas POR IGUAL, trabalhando em prol dos interesses comuns de TODOS, e não somente dos de seu gueto religioso.

Repito: não sou contrário a uma candidatura “evangélica”, muito menos contra a pré-candidatura de Marco Feliciano ou de qualquer outro pastor. Quem sabe, não é mais uma opção em uma completa falta de bons nomes para a sucessão presidencial. Aqui aonde moro, nem mesmo temos boas opções para candidaturas a prefeito e governador... Nomes como o de Marco Feliciano podem ser bem vindos neste cenário atual...

Mas sou contra a “teologia do irmão-que-vota-em-irmão”, sou contra a idéia de “salvador da pátria gospel”, a idéia tabajariana de que com um presidente crente todos os nossos problemas vão se acabar! Sou contra a idéia de votar em um crente despreparado, achando que o simples fato de ser crente o torna melhor que um ímpio preparado e capacitado.

Àqueles que discordam deste meu último ponto de vista, sugiro uma questão: se você estivesse com uma doença grave, com indicação cirúrgica imediata, com qual cirurgião você se submeteria a tal intervenção: um cirurgião crente, mas inapto e despreparado, ou um cirurgião ímpio e ateu, mas capacitado e preparado???

Entendam: a política não difere tanto assim da cirurgia! Já afirmou Berthold Brecht, discorrendo sobre o analfabeto político, que o bom e o mau político (seja ele cristão, ateu, ou professo de qualquer outra religião) são responsáveis pela condução de nossa vida social, pelo preço do feijão, da carne e da gasolina. O mau político se torna facilmente um lacaio de multinacionais e de grupos escusos —  e um político "cristão" está igualmente sujeito a tais subserviências políticas. Se escolhemos com critério e cuidado quem vai nos extrair uma verruga em um procedimento cirúrgico, porque escolher qualquer um para conduzir a nação, usando apenas por critério o fato de ele professar a nossa fé religiosa???

É pra se pensar...